segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

qual o meio processual cautelar mais adequado?

caros ,

Ainda que o dia tenha apenas 24 horas, sendo uma realidade incontornável, não consigo deixar de me ater e manifestar relativamente a esta questão que deu azo a uma critica "construtiva".

Se após a primeira intervenção do João discordei da solução encontrada para o problema da suposta falta de Avaliação de impacte ambiental e de que forma isso inquina o acto, perante este segundo post sinto me na obrigação, ainda que repleta de dúvidas, de dar o meu contributo para o “dinamismo” do blog.

Não me pretendo alongar e por conseguinte não me vou debruçar sobre a questão dos embargos administrativos.


No que diz respeito ao Procedimento de AIA, quando um acto de licenciamento de uma actividade ou construção encontra-se sujeito a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, a Declaração de Impacte Ambiental constitui um acto administrativo obrigatório no procedimento, sob pena de enfermar o acto de um vício de ilegalidade. Claro está, que a ausência de outras mais exigências legais poderão enfermar o acto como seja a não realização de consulta pública.


Assim, o procedimento administrativo de licenciamento, para além de outros actos instrumentais, como um parecer de entidades públicas no âmbito do Procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental, comporta dois actos administrativos: a Declaração de Impacto Ambiental a proferir pelo Ministério do Ambiente e a atribuição da Licença pela entidade competente.

O primeiro acto é sem margem para dúvidas vinculativo não só em termos formais, e por formais entenda-se a sua existência, como também substantivos uma vez que não se pode atribuir uma licença quando a DIA tenha sido desfavorável.

No entanto, temos seguramente dois actos administrativos.
Assim, perante a ausência da DIA, o acto de licenciamento é ilegal, mas produz efeitos mais não seja que materiais (ou não foi o transporte de electricidade efectivamente realizado por aquelas linhas e se queixaram os seis habitantes de cefaleias severas?).
Admitir como entendi que admitiu o João Guerra em claro protesto ao sustentado pelo Hugo que a suspensão de eficácia não é o meio cautelar mais adequado, tendo por base o argumento de que o acto de licenciamento padece de vicio gravoso é no mínimo desprover de conteúdo o artigo 112 n.º2 alínea a).

Com efeito, o que se pretende suspender é o acto, que na realidade foi praticado, de Licença de instalação. É este acto que se pretende paralisar os seus efeitos, pois é o funcionamento das linhas instaladas que viola os direitos ou interesses dos autores, e é por existência de receio de que a pretensão perca utilidade na pendência do processo principal que se intenta uma providência cautelar de suspensão.

Com efeito, "a suspensão de eficácia de actos administrativos serve para proteger os interesses daqueles que, no processo principal, pretendam obter licenças que, anulando actos ilegais ou declarando a respectiva nulidade e inexistência, façam com que tudo permaneça como era antes de esses actos terem sido praticados "( Mario Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina)

Pense-se a titulo exemplificativo, numa situação mais simples como seja a de uma licença de construção que padece de ilegalidade por desconformidade com o plano director municipal: não será um vício suficientemente gravoso? É uma mera formalidade? Não, não é mera formalidade mas sim condição para que a mesma seja atribuída e não restam duvidas que o expediente mais adequando seja a suspensão de eficácia sempre que um outro particular veja violado os seus direitos, que poderão ser fundamentais como o direito ao ambiente.

A providência cautelar de suspensão de eficácia permite impedir a execução de actos administrativos de conteúdo positivo, como é o caso em questão, articulados com processos principais de impugnação, dirigidos a obter a anulação ou declaração de nulidade desses actos.
Ora, em que se traduz mais a paralisação do transporte de electricidade nas linhas de alta tensão, permitido pela atribuição da licença que não apenas na suspensão de eficácia do acto de licenciamento?

Quanto à intimação para adopção ou abstenção de uma conduta contemplado no artigo 112.º n.º 2 alínea f), que corresponde a uma providência cautelar antecipatória, verificamos que o espírito da norma é diferente, visando principalmente acautelar relações jurídicas administrativas inter-privados, visto que o artigo menciona " (...) por parte da Administração ou de um particular".

Assim, este seria o mecanismo próprio se a Associação quisesse reagir contra a REN na ausência de acto de licenciamento, sendo este processo cautelar adjuvante do pedido principal de condenação do artigo 37.º n.º 3 CPTA: "quando sem fundamento em acto administrativo impugnável."
Ora, como o acto de licença, independentemente de saber se o mesmo padece de vício nulidade ou vicio inexistência, existiu, este mecanismo não é o processualmente mais adequado para acautelar a pretensão da Associação.

Seria porventura, caso apenas fosse legalmente exigida, para a instalação e funcionamento das linhas, a concessão atribuída à REN pelo Estado.

Por outro lado, e pretendendo-se intimar a Administração à adopção ou abstenção de comportamentos, esta providência surge como medida cautelar típica da acção de condenação à adopção ou abstenção de comportamentos mencionada no artigo 37 n.º 2 alínea c) (que se traduz numa tutela preventiva) ou condenação da Administração ao cumprimento de deveres de prestar, a que se refere o artigo 37.º n.º 2 alínea e).

Mais uma vez, em ambas as normas mencionadas, o pedido a titulo principal prende-se com a “…designadamente…não emissão de um acto quando seja provável a emissão de um acto lesivo” e “… não envolvam a emissão de um acto administrativo impugnável”, respectivamente”.

Face ao exposto, tendo existido como existiu um acto administrativo impugnável, o meio processual a titulo principal adequado é a impugnação do acto cumulada com o pedido de condenação da Administração à adopção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados.

No meu entender, ancorado claro está numa interpretação da lei coadjuvada pela Doutrina e jurisprudência vigentes, o meio processual cautelar de intimação afigura-se para situações materialmente distintas, nas quais não houve emissão de um acto administrativo.

Com efeito, a providência cautelar vertida na alínea f) parece reconduzir-se, caso se pretenda intimar a Administração à adopção de condutas, a uma espécie de providência antecipatória com a relevante diferença que ao contrário desta última não se pretende no processo principal a emissão de um acto administrativo, mas tão somente de uma conduta, prestação, (…) que decorra de normas administrativas.

Acresce ao exposto, que o entendimento supra explanado é o que melhor se coaduna com o conceito de providência cautelar antecipatória.

Com a dedução de uma providência cautelar antecipatória, e nomeadamente a da intimação, pretende-se antecipar, a titulo provisório, a constituição de uma situação jurídica nova, diferente da existente à partida. Por exemplo, obrigar um certo órgão administrativo a pagar certo montante, a prestar ou abster-se de praticar certo facto.

Ora, no caso em apreço não se pretende uma situação nova, mas sim a situação existente antes da execução ou produção de efeitos do acto administrativo de licença. Pretende-se conservar a situação antes do acto administrativo em causa e não antecipar nada que não se tivesse já previamente constituído.

O direito ao ambiente e à qualidade de vida existiam plenamente antes da licença, não se pretendendo a constituição ou atribuição destes direitos mas sim a conservação dos mesmos.

Resta-me assim concluir que partilho da solução preconizada pelo Hugo, considerando que a providência cautelar conservatória afigura-se como um meio processual adequado, não vislumbrando como se possa, no caso em apreço, recorrer à situação do artigo 112.º n.º 2 alínea f) do CPTA, não todavia desconsiderando a posição defendida pelo João.

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