sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Gestão de Resíduos - Princípios

Caros Colegas,

Atendendo à época natalícia que se aproxima a passos largos, com a sua inevitável onda de consumismo desenfreado, entendo ser oportuno efectuar algumas e breves considerações a propósito do regime jurídico da gestão de resíduos, e sobretudo tendo em atenção uma disposição inserida neste novo regime jurídico que se prende com o princípio da responsabilidade do cidadão (cfr. art. 8º) em matéria da prevenção de resíduos.
O regime geral da gestão de resíduos consta do DL n.º 178/2006 de 5 de Setembro. O citado diploma legal procedeu à transposição para o ordenamento jurídico português da Directiva n.º 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril e a Directiva n.º 91/689/CEE, do Conselho de 12 de Dezembro.
Os princípios fundamentais em matéria de direito de ambiente, o princípio do desenvolvimento sustentado, princípio da prevenção, aproveitamento racional dos recursos naturais, eficácia ambiental e o do poluidor pagador, enformam este regime jurídico da gestão de resíduos.
O citado diploma legal consagra um conjunto de princípios em matéria de gestão ambiental (cfr. art. 4º a 10º), que concretizam os princípios constitucionais em matéria de direito de ambiente.
O art. 5º o princípio da responsabilidade pela gestão, concretiza o principio do poluidor pagador, como escreve a Prof. Maria Alexandra Aragão, a propósito da natureza jurídica deste princípio, in O princípio do poluidor pagador – pedra angular da politica comunitária do ambiente, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que passamos a transcrever “ O PPP começou por ser apenas um princípio económico, visando alcançar a máxima eficácia na internalização dos custos, mas ascendeu posteriormente a princípio geral de direito do ambiente, podendo considerar-se actualmente um princípio de ordem pública ecológica. A OCDE, grande defensora do PPP, classifica-o como uma regra de bom senso económico, jurídico e político.”
O art. 6º estabelece o princípio da prevenção e redução. Trata-se de um dos princípio fundamentais em matéria de ambiente, de todo o modo o princípio da prevenção está presente em todos os princípios estatuídos neste regime da gestão de resíduos, tendo este preceito consagrado-o expressamente, tem por base uma noção do senso comum “mais vale prevenir do que remediar”.
O art. 7º do citado diploma estabelece o princípio da hierarquia das operações de gestão de resíduos, o n.º 1 deste artigo por ler-se “ A gestão dos resíduos deve assegurar que à utilização de um bem sucede uma nova utilização ou que, não sendo viável a sua reutilização, se procede à sua reciclagem ou ainda a outras formas de utilização.” E o n.º 4º do mesmo art. estabelece o que passamos a transcrever: “Deve ser privilegiado o recurso às melhores tecnologias disponíveis com custos economicamente sustentáveis que permitam o prolongamento do ciclo de vida dos materiais através da sua reutilização, em conformidade com as estratégias complementares adoptadas noutros domínios.”
Desde logo, o n.º 1 do referido art. apela a uma hierarquização das formas de gestão de resíduos ou seja, reutilização, reciclagem, valorização e só em último recurso a deposição em aterro (cfr n.º 2) que constitui a forma de eliminação dos resíduos mais danosa para o ambiente, sendo a reutilização a forma mais inócua em termos ambientais. Aqui está subjacente, entre outros princípios, o de princípio do aproveitamento racional dos recursos naturais, e o da prevenção, uma vez mais. A reutilização dos bens permite diminuir não só a quantidade de resíduos produzidos mas também a própria poluição.
O recurso às melhores tecnologias disponíveis, em similitude com o regime da PCIP, de modo a garantir de forma mais eficaz minimizar o impacto negativo no ambiente dos resíduos, incentivando a valorização dos resíduos para a obtenção de energia.
Perante a consciencialização da finitude dos recursos naturais, tornou-se imprescindível a adopção de medidas que assegurem a sua utilização eficaz, ou dito de outro modo a medidas que assegurem a sua utilização racional. As crises petrolíferas dos anos 70, despertaram na opinião pública ocidental para a questão da finitude dos recursos naturais. Na presente data, esta questão tornou-se um problema cuja não resolução pode por em causa a sobrevivência da própria espécie humana. Daí a importância da adopção de soluções e práticas sustentáveis, ou seja, a satisfação das necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.

O princípio consagrado no art. 8º do DL 178/2006 de 5 de Setembro, o da responsabilização do cidadão: “ Os cidadãos contribuem para a prossecução dos princípios e objectivos referidos nos artigos anteriores, adoptando comportamentos de carácter preventivo em matéria de produção de resíduos, bem como práticas que facilitem a respectiva reutilização e valorização.” Este preceito é inovador, insere-se neste novo conceito de Estado pós-social, regulador no qual os particulares assumem tarefas que eram da competência do Estado Social. A tarefa de protecção e defesa do ambiente continua a ser uma tarefa fundamental do Estado, cfr. art. 9º alíneas d) e e). O legislador não transfere esse ónus para os particulares, estes são chamados a colaborarem com o Estado na prossecução de um fim que é de todos. O direito ao ambiente é um direito verdadeiro direito fundamental do indivíduo (cfr. art. 66º da CRP), mas a defesa do ambiente constitui um dever objectivo de cada um, art. 66º n.º 1 e 2 da CRP.
A este propósito escreve o Prof. Vasco Pereira da Silva, in Direito Salpicado de Azul e Verde, estudos em homenagem ao Prof. Marques Guedes, pág. 848 “ Mas, não só do ponto de vista teórico como do da praticabilidade creio bem que a melhor forma de defender o ambiente passa pela tomada de consciência pelas pessoas dos direitos que possuem neste domínio e não pela personificação das realidades naturais, mediante a indistinção entre protecção jurídica subjectiva e tutela objectiva, e com a consequente inutilização prática da noção de direito subjectivo. Ainda, para mais, entre nós, se se tiver em conta a lógica latina da “alienidade” do Estado, tão bem expressa no conto de Jorge Luís Borges, ao escrever que o “homem do norte” fala do Estado como “nós”, enquanto que o do “sul” se lhe refere como “eles”.”
Pretende-se com esta disposição incentivar o exercício da cidadania, e ao cumprimento do preceito constitucional que impõe a cada um o dever de defender o ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, cfr. art. 66º n.º 1 da CRP.

Desejo a todos os Colegas e ao Prof. Vasco Pereira da Silva um Feliz Natal e um excelente Ano de 2008

Luísa Marques da Silva

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