segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO

DESEJO A TODOS UM FELIZ NATAL E UM VERDE PRÓSPERO E SUSTENTADO ANO NOVO.

RMA

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Bom Natal

Meus caros colegas

Mantendo esta tradição que se instalou no nosso blog quero desejar a todos um Bom Natal e um optimo 2008.

Deixou-vos igualmente uma sugestão ambiental...o google criou um motor de busca ecologico que permite poupar energia, o endereço e www.blackle.com e lanço o desafio de o tornarem a vossa home page, até porque funciona exactamente da mesma maneira que o google.

Ate para o proximo ano.

Gestão de Resíduos - Princípios

Caros Colegas,

Atendendo à época natalícia que se aproxima a passos largos, com a sua inevitável onda de consumismo desenfreado, entendo ser oportuno efectuar algumas e breves considerações a propósito do regime jurídico da gestão de resíduos, e sobretudo tendo em atenção uma disposição inserida neste novo regime jurídico que se prende com o princípio da responsabilidade do cidadão (cfr. art. 8º) em matéria da prevenção de resíduos.
O regime geral da gestão de resíduos consta do DL n.º 178/2006 de 5 de Setembro. O citado diploma legal procedeu à transposição para o ordenamento jurídico português da Directiva n.º 2006/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril e a Directiva n.º 91/689/CEE, do Conselho de 12 de Dezembro.
Os princípios fundamentais em matéria de direito de ambiente, o princípio do desenvolvimento sustentado, princípio da prevenção, aproveitamento racional dos recursos naturais, eficácia ambiental e o do poluidor pagador, enformam este regime jurídico da gestão de resíduos.
O citado diploma legal consagra um conjunto de princípios em matéria de gestão ambiental (cfr. art. 4º a 10º), que concretizam os princípios constitucionais em matéria de direito de ambiente.
O art. 5º o princípio da responsabilidade pela gestão, concretiza o principio do poluidor pagador, como escreve a Prof. Maria Alexandra Aragão, a propósito da natureza jurídica deste princípio, in O princípio do poluidor pagador – pedra angular da politica comunitária do ambiente, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que passamos a transcrever “ O PPP começou por ser apenas um princípio económico, visando alcançar a máxima eficácia na internalização dos custos, mas ascendeu posteriormente a princípio geral de direito do ambiente, podendo considerar-se actualmente um princípio de ordem pública ecológica. A OCDE, grande defensora do PPP, classifica-o como uma regra de bom senso económico, jurídico e político.”
O art. 6º estabelece o princípio da prevenção e redução. Trata-se de um dos princípio fundamentais em matéria de ambiente, de todo o modo o princípio da prevenção está presente em todos os princípios estatuídos neste regime da gestão de resíduos, tendo este preceito consagrado-o expressamente, tem por base uma noção do senso comum “mais vale prevenir do que remediar”.
O art. 7º do citado diploma estabelece o princípio da hierarquia das operações de gestão de resíduos, o n.º 1 deste artigo por ler-se “ A gestão dos resíduos deve assegurar que à utilização de um bem sucede uma nova utilização ou que, não sendo viável a sua reutilização, se procede à sua reciclagem ou ainda a outras formas de utilização.” E o n.º 4º do mesmo art. estabelece o que passamos a transcrever: “Deve ser privilegiado o recurso às melhores tecnologias disponíveis com custos economicamente sustentáveis que permitam o prolongamento do ciclo de vida dos materiais através da sua reutilização, em conformidade com as estratégias complementares adoptadas noutros domínios.”
Desde logo, o n.º 1 do referido art. apela a uma hierarquização das formas de gestão de resíduos ou seja, reutilização, reciclagem, valorização e só em último recurso a deposição em aterro (cfr n.º 2) que constitui a forma de eliminação dos resíduos mais danosa para o ambiente, sendo a reutilização a forma mais inócua em termos ambientais. Aqui está subjacente, entre outros princípios, o de princípio do aproveitamento racional dos recursos naturais, e o da prevenção, uma vez mais. A reutilização dos bens permite diminuir não só a quantidade de resíduos produzidos mas também a própria poluição.
O recurso às melhores tecnologias disponíveis, em similitude com o regime da PCIP, de modo a garantir de forma mais eficaz minimizar o impacto negativo no ambiente dos resíduos, incentivando a valorização dos resíduos para a obtenção de energia.
Perante a consciencialização da finitude dos recursos naturais, tornou-se imprescindível a adopção de medidas que assegurem a sua utilização eficaz, ou dito de outro modo a medidas que assegurem a sua utilização racional. As crises petrolíferas dos anos 70, despertaram na opinião pública ocidental para a questão da finitude dos recursos naturais. Na presente data, esta questão tornou-se um problema cuja não resolução pode por em causa a sobrevivência da própria espécie humana. Daí a importância da adopção de soluções e práticas sustentáveis, ou seja, a satisfação das necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.

O princípio consagrado no art. 8º do DL 178/2006 de 5 de Setembro, o da responsabilização do cidadão: “ Os cidadãos contribuem para a prossecução dos princípios e objectivos referidos nos artigos anteriores, adoptando comportamentos de carácter preventivo em matéria de produção de resíduos, bem como práticas que facilitem a respectiva reutilização e valorização.” Este preceito é inovador, insere-se neste novo conceito de Estado pós-social, regulador no qual os particulares assumem tarefas que eram da competência do Estado Social. A tarefa de protecção e defesa do ambiente continua a ser uma tarefa fundamental do Estado, cfr. art. 9º alíneas d) e e). O legislador não transfere esse ónus para os particulares, estes são chamados a colaborarem com o Estado na prossecução de um fim que é de todos. O direito ao ambiente é um direito verdadeiro direito fundamental do indivíduo (cfr. art. 66º da CRP), mas a defesa do ambiente constitui um dever objectivo de cada um, art. 66º n.º 1 e 2 da CRP.
A este propósito escreve o Prof. Vasco Pereira da Silva, in Direito Salpicado de Azul e Verde, estudos em homenagem ao Prof. Marques Guedes, pág. 848 “ Mas, não só do ponto de vista teórico como do da praticabilidade creio bem que a melhor forma de defender o ambiente passa pela tomada de consciência pelas pessoas dos direitos que possuem neste domínio e não pela personificação das realidades naturais, mediante a indistinção entre protecção jurídica subjectiva e tutela objectiva, e com a consequente inutilização prática da noção de direito subjectivo. Ainda, para mais, entre nós, se se tiver em conta a lógica latina da “alienidade” do Estado, tão bem expressa no conto de Jorge Luís Borges, ao escrever que o “homem do norte” fala do Estado como “nós”, enquanto que o do “sul” se lhe refere como “eles”.”
Pretende-se com esta disposição incentivar o exercício da cidadania, e ao cumprimento do preceito constitucional que impõe a cada um o dever de defender o ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, cfr. art. 66º n.º 1 da CRP.

Desejo a todos os Colegas e ao Prof. Vasco Pereira da Silva um Feliz Natal e um excelente Ano de 2008

Luísa Marques da Silva

Da Legislação Comunitária Ambiental


Questões referentes à transposição de legislação comunitária ambiental


Em primeiro lugar, e para o devido enquadramento desta questão importa distinguir as diferentes manifestações normativas no quadro da Comunidade Europeia. Assim, os regulamentos aparecem como o meio adequado para regular directamente determinadas medidas (sem necessidade de transposição para os ordenamentos jurídicos nacionais, embora em alguns casos excepcionais os Estados membros produzam normas internas com o intuito de facilitar a sua aplicação). Exemplo paradigmático em matéria ambiental é o Regulamento relativo ao sistema comunitário de atribuição de rótulo ecológico (Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho 1980/2000 CE). No caso das Directivas é deixada aos Estados membros liberdade para escolher os meios mais adequados na prossecução dos fins ou metas estabelecidos pela CE, carecendo para o efeito de transposição para o ordenamento jurídico nacional. Além destas duas formas podemos também identificar as decisões (obrigatórias para os respectivos destinatários) e as recomendações e resoluções (que embora não possuam um carácter vinculativo, contribuem para a correcta interpretação dos princípios e dos valores defendidos pela CE).


Incumbe aos Estados membros a obrigatoriedade de cumprir o direito comunitário. No entanto, a CE tem o dever de vigilância e de fiscalização do cumprimento da legislação, nomeadamente em matéria ambiental, tal como decorre do preceituado no Artº 211 do Tratado que atribui à Comissão a tarefa de supervisão e controlo do preceituado pelas instituições comunitárias. Podemos considerar que relativamente à transposição de Directivas o trabalho da Comissão é pontual e embora complexo, não revela particular dificuldade. Os problemas surgem quando, na prática, os Estados membros não exercem poderes de fiscalização e/ou repressão relativos à falta de cumprimento de disposições comunitárias (ou nacionais decorrentes da transposição daquelas). O que acontece é que muitas vezes a Comissão só toma conhecimento da infracção de normas ambientais quando ocorrem catástrofes devido aqueles incumprimentos.


A Comissão não possui sistemas administrativos de inspecção de nível nacional, local ou regional que informem sobre a correcta aplicação do direito ambiental comunitário. Na prática, o que acontece é que os funcionários da Comissão realizam visitas a instalações ou zonas de que tenham, por um qualquer meio (muitas vezes através da Agência Europeia de Meio Ambiente), tido conhecimento de possíveis infracções ambientais. Estas visitas revestem um carácter informal e pouco estruturado. De referir que a Agência Europeia de Meio Ambiente tem como escopo apenas a recolha e tratamento de informação ambiental. Assim, e pese embora a obrigatoriedade ou o dever comunitário de vigilância e fiscalização do cumprimento da legislação ambiental, esta tarefa tem sido efectuada sobretudo a nível nacional. De referir a existência da IMPEL (Implementation and enforcement of environmental Law Network) constituída pelos representantes das administrações e da Comissão responsáveis pelo cumprimento e fiscalização da legislação ambiental comunitária. Das reuniões da IMPEL destaca-se o intercâmbio de informação relativo às melhores práticas nesta matéria. De assinalar também, a este propósito, a Recomendação 2001/331/CE relativa a critérios mínimos que os Estados membros devem adoptar nas inspecções que efectuem a instalações que tenham sido objecto de uma autorização concedida ao abrigo de normativos decorrentes de direito comunitário.


O alto grau de incumprimento da legislação comunitária ambiental
O próprio Estado é, muitas vezes, prevaricador em direito ambiental comunitário. Na grande maioria dos casos, a Comissão toma conhecimento das infracções cometidas pelo Estado porque os cidadãos denunciam essas situações ou então através de reclamações. Quando a Comissão toma conhecimento das infracções ambientais cometidas pelo Estado dá início ao Processo de Infracção previsto no Art. 226 do Tratado. O Estado membro pode tomar uma de duas posições: ou contesta fundamentando a sua conduta ou rectificando-a; ou não contesta insistindo na infracção, caso em que a Comissão dirige uma orientação ao Estado no sentido de pôr termo à infracção. Se ainda assim o Estado não cumprir a orientação da Comissão, esta interpõe uma acção por incumprimento junto do Tribunal de Justiça. O TJCE tem considerado de especial gravidade o incumprimento dos Estados membros em matéria de ambiente realçando que estes possuem a tarefa de “gerir património comum nos seus respectivos territórios” (Sentença Comissão v Países Baixos de 13 Outubro de 1987). As sentenças do TJCE começaram por ser meramente declarativas, entretanto ganharam força de verdadeiras sanções pecuniárias.


E quanto aos particulares?
O legislador português reconhecendo uma dupla natureza ao direito do ambiente, quer como direito fundamental, subjectivo (art.66º da CRP), quer como bem jurídico objectivo, enquanto princípio geral e como tarefa fundamental do Estado (art. 9º da CRP), optou pela criminalização das condutas mais graves em matéria de ambiente nomeadamente, o crime de danos contra a natureza (art.278º do Código Penal), o crime de poluição (art. 279º do CP), e o crime de poluição com perigo comum (art. 280º do CP). Embora reconhecendo que a defesa do ambiente é parte integrante dos valores fundamentais da sociedade em que vivemos e, por isso, considerando-o parte do contrato social, o legislador nacional optou por estabelecer a via administrativa como o modo normal de reacção perante infracções ambientais.

Feliz Natal e Bom Ano!

Rectificação as alegações finais da contra-interessada REN

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE FLORA
2.º JUÍZO
4.ª UNIDADE ORGÂNICA
PROCESSO n.º 3879/07 DABSB


EX.MOS SENHORES JUIZES DE DIREITO,

R.E.N. – Rede eléctrica nacional, s.g.p.s., s.a., contra-interessada melhor identificada na acção acima mencionada, em que é Autora a ASSOCIAÇÃO LUGAR DO ERMO e em que é R. o MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA INOVAÇÃO (doravante identificado por ‘MEI’), vem apresentar as suas

ALEGAÇÕES FINAIS

O que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
I
INTRODUÇÃO

Através da presente acção administrativa especial, a A. impugna o acto administrativo de licenciamento de instalação e funcionamento das Linhas de muito alta tensão instaladas no Lugar do Ermo, cumulando-a com um pedido de condenação à restituição da situação anterior à instalação e com um pedido de indemnização no valor de 250.000€, a título de responsabilidade civil extracontratual do MEI.

Não assiste à A., porém, fundamento para a procedência da presente acção, como adiante se explicitará. Senão vejamos:
II
DA VALIDADE DO ACTO DE LICENCIAMENTO

No que diz respeito ao vicio nulidade por violação das normas respeitantes ao Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, o pedido de licenciamento efectuado junto da DGEG a 18 de Maio de 2004, foi correctamente instruído, tendo a REN junto, para efeitos de Avaliação do Impacto Ambiental, o Estudo de Impacte Ambiental, de acordo com o preceituado no artigo 12.º n.º1 do Decreto-Lei 69/2000 e subsequentes alterações ( cfr. documentos juntos a fls...no processo e depoimento da Senhora Eng.ª Marlene Paiva).

Acrescente-se ainda, que todos os trâmites de cumprimento obrigatório, sob cominação de nulidade, foram respeitados, nomeadamente a solicitação de pareceres às entidades devidas e a realização de consulta pública, conforme resultou dos depoimentos das testemunhas Senhor João Portugal e Senhora Eng.ª Marlene Paiva.

Neste sentido, houve proposta de Declaração de Impacto Ambiental que continha parecer favorável e deferimento tácito deste ultimo acto, conforme prova documental junta aos autos e depoimento da testemunha Senhora Eng.ª Marlene Paiva.

Por conseguinte, a Licença de instalação e funcionamento emitida em 12.05.2006 pela DGEG foi manifestamente legal, tendo concluído e respeitado, e porque vinculativo, todo o procedimento de Avaliação de Impacto Ambiental.

Cumpre agora conhecer da questão da realização da audiência de interessados, direito o qual assiste aos interessados nos termos do artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo.

Os habitantes do Conselho do Ermo foram notificados do sentido provável da decisão de licenciamento das linhas de muito alta tensão.
Contudo, equaciona-se a nulidade do acto administrativo com fundamento em falta de notificação da Associação Lugar do Ermo para se pronunciar em sede de audiência de interessados.

Para este efeito, refere Associação Lugar do Ermo, a extensão subjectiva do direito de participação ocorrida pelo disposto no artigo 8.º do CPA e artigos 1.º n.º2 e 2.º n.º1 da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto relativa ao Direito de participação procedimental e de Acção Popular.

A REN não coloca em questão a natureza da formalidade da audiência, que corresponde a um direito dos interessados, com dignidade e assento constitucional.

Não obstante, cumpre interrogar se a falta de audiência da associação, havendo audiência de pessoa directamente interessada prejudica, ou não, a validade jurídica da decisão do procedimento.

A este propósito refira-se o entendimento de Mário Esteves de Oliveira e Outros: “No máximo, deve, pois, considerar-se a formalidade como não essencial (ou só relativamente essencial) geradora de invalidade apenas quando se pudesse afirmar ter sido redundado em prejuízo do exercício consciencioso e prudente do direito de audiência." (Código do Procedimento Administrativo comentado, 2ª edição, Almedina, p.456).
Reportando-nos agora ao caso em apreço, verificamos que os interessados, os habitantes do concelhos abrangido pela instalação das linhas de muito alta tensão foram notificados para se pronunciarem em sede de audiência de interessados.

Assim, não houve “prejuízo do exercício consciencioso e prudente do direito de audiência”, pois os concretos seis interessados, que correspondem aos visados pelos interesses que a Associação do Lugar do Ermo prossegue foram devidamente notificados para exercerem o seu direito.
Pelo que a violação da imposição de notificação da decisão à Associação Lugar do Ermo, determinada pelo artigo desemboca, no limite, num vício de irregularidade, porquanto corresponde a uma formalidade não essencial, e consequentemente, sem qualquer relevância invalidante do acto.

Neste sentido, vide o Acórdão do STA, da 1.ª Subsecção do Contencioso Administrativo, de 18-05-2000, com o n.º de processo 045965, tendo por relator o Juiz Conselheiro Santos Botelho, disponível para consulta em www.dgsi.pt, onde se refere:
I - Tratando-se de vícios atinentes com violação de preceitos de natureza fundamentalmente instrumental pode colocar-se a questão da ausência de efeitos invalidantes designadamente através da "degradação" das formalidades que, passariam de essenciais a não essenciais a não o que sucederia em especial quando não obstante a sua preterição não se tenham chegado a afectar ou restringir as garantias procedimentais que se pretendiam tutelar com a realização das formalidades omitidas.

Por conseguinte, a formalidade cuja violação a Associação Lugar do Ermo alegou é não essencial, traduzindo-se numa mera irregularidade não geradora de invalidade, pelo que o acto administrativo não deverá ser declaro nulo, também por esse motivo.
Ainda que assim não se entenda – hipótese que apenas se coloca por cautela de patrocínio - e, por conseguinte, se declare nulo o acto impugnado, a condenação da Administração à reposição da situação existente anterior ao mesmo sempre deverá improceder, uma vez que o cumprimento dos deveres a que seria condenada originaria um excepcional prejuízo para o interesse público, bem como constituiria uma violação do Princípio da Proporcionalidade, constitucionalmente consagrado, nos termos melhor descritos infra.

O princípio da proporcionalidade pelo qual deve pautar-se a actuação da Administração Pública significa que esta não está apenas obrigada a “prosseguir o interesse público – a alcançar os fins visados pelo legislador –, mas a consegui-lo pelo meio que represente um menor sacrifício para as posições jurídicas dos particulares” (Mário Esteves de Oliveira e outros, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª Edição, Livraria Almedina, Coimbra 1997, p. 103).
59º
Na “análise do princípio apontam-se habitualmente três subprincípios: de necessidade, de adequação e de racionalidade ou proporcionalidade stricto sensu” (Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV – Direitos Fundamentais, 3.ª edição, Coimbra Editora, 2000, p. 207 e João Caupers, Direito Administrativo, Editorial Noticias,1996 p. 68).
60º
A vertente “necessidade” do princípio da proporcionalidade, significa que a lesão das posições jurídicas dos interessados tem que se mostrar necessária ou exigível (ou seja, por qualquer outro meio não conseguir satisfazer o interesse público visado).
61º
Por outro lado, a vertente da proporcionalidade stricto sensu impõe, segundo Mário Esteves de Oliveira e outros, que “a lesão sofrida pelos administrados deve ser proporcional e justa em relação ao benefício alcançado para o interesse público (proporcionalidade custo/benefício)” – cfr. Código de Procedimento Administrativo Comentado, Almedina, p. 104.
62º
Assim, determinar a reposição do terreno nas condições originais sem esgotar as possibilidades de legalização da instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão em causa nos autos, violaria o princípio da proporcionalidade, presente no artigo 5.º do CPA e artigo 266.º da CRP.


Cumpre ainda abordar o Principio do Aproveitamento do acto administrativo, artigo 45.º do CPTA.

A declaração de nulidade do acto e a posterior reposição da situação jurídica anterior existente, por comportar a desactivação das linhas de muito alta tensão, implicará um grave prejuízo para o interesse público.

Com efeito, a remoção das linhas por impossibilitar o transporte de energia e aos concelhos do ermo e outro limítrofes, implicará o não abastecimento de populações que rondam as 5000 pessoas.

A não realização desta tarefa à qual a Administração encontra-se constitucionalmente adstrita, significará a não concretização e cabal protecção de direitos fundamentais como o direito à qualidade de vida, na medida em que as povoações não beneficiarão de luz e água quente, direito ao ensino e direito à saúde pois não estão reunidas as condições de segurança e salubridade

Assim, verifica-se que com a paragem de funcionamento das linhas e consequente remoção das mesmas, violar-se-á direitos fundamentais prejudicando-se o interesse público.

Acrescente-se que, sendo a energia eléctrica transportada por estas linhas de alta tensão, enquadra-se na concretização da Estratégia politica com expressão constitucional de Desenvolvimento Sustentável.

Face ao exposto, verifica-se que a condenação da Administração à reposição da situação anterior existente em virtude de sentença que declare a nulidade do acto, configurará um grave prejuízo para o interesse público.

Neste sentido, segundo Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “quanto ao grave prejuízo para o interesse público, ele apenas deve ser reconhecido em situações limite, muito excepcionais, de claro desequilíbrio entre os interesses em presença, nas quais possa se possa realmente afirmar que os prejuízos que, para a comunidade, adviriam da realização da prestação devida são claramente superiores ao sacrifício que para o interessado representa a não satisfação do seu direito.”(Comentários ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, paginas 808 e 809, Almedina, 2005).

Por conseguinte, estamos perante uma situação de modificação objectiva da instância contemplada no artigo 45.º n.º 1 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, extensível à acção administrativa especial por força do preceituado no artigo 49.º do CPTA, sendo uma causa legitima de inexecução pela Administração da sentença declarativa de nulidade nos termos do artigo 163.º do CPTA.

Com efeito, encontram-se reunidos o pressupostos de “excepcional prejuízo para o interesse público” para obstar à execução da sentença declarativa de nulidade, justificando-se por isso, no caso em apreço, um sucedâneo económico que poderá no limite respeitar a um valor que possibilite um realojamento dos 6 habitantes distribuídos por 3 fogos, à semelhança do que aconteceu na história verídica de “aldeia da luz”.

III
DA COLISÃO DE DIREITOS CONSTITUCIONALMENTE PROTEGIDOS

O ambiente, apesar de ser um bem social unitário, é dotado de uma indiscutível dimensão pessoal.

Inclusivamente, e corroborando esta ideia, numa série de ordens jurídicas o direito ao ambiente é entendido como direito fundamental individual com suficiente dignidade para ser tutelado pela própria Constituição.

A título exemplificativo, refira-se o caso do Brasil, cuja Constituição[1] de Outubro de 1998 dispõe expressamente: “todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Político e à colectividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

De igual modo, a Constituição espanhola estabelece que “todos têm direito a desfrutar de um meio ambiente adequado ao desenvolvimento da pessoa, assim como o dever de o conservar”[2].

Como bem acentua GOMES CANOTILHO[3], “a leitura conjugada das normas constitucionais e das normas legais aponta, desde logo, para a existência de um direito subjectivo ao ambiente, autónomo e distinto de outros direitos também constitucionalmente protegidos”, o que determina que “ o direito ao ambiente sadio e ecologicamente equilibrado surge como direito subjectivo inalienável pertencente a qualquer pessoa”.

Destarte, por maior importância que se atribua à qualificação do ambiente como bem público, a sua dimensão subjectiva nunca poderá, na consideração jurídica, ser olvidada.

Nesta linha, a Constituição portuguesa, acolhe o ambiente como direito fundamental do cidadão e como “tarefa fundamental do Estado”[4], conferindo ao ambiente uma dimensão objectiva e subjectiva.

Tendo em conta o exposto, e não obstante, a verdade é que a existência de violações dos direitos subjectivos dos membros da Associação Lugar do Ermo não ficou devidamente provada em juízo.

Em boa verdade se diga que quer a prova documental apresentada[5], quer a pericial e testemunhal, não permitem, de forma cabal, asseverar a existência de violações ao direito do ambiente dos 6 habitantes de Lugar do Ermo.

Face à parafernália de meios de prova apresentados, assim como a dissidência material de conteúdo entre os mesmos, a verdade é que só por exercício de imaginação se defenderá, com algum grau de certeza, a existência de violações ao direito ao ambiente dos membros da Associação Lugar do Ermo.

Ainda que este entendimento não proceda, hipótese que não se concede mas que só por dever de patrocínio se concebe, a verdade é que facilmente se antolham outros direitos e interesses que não poderão ser esquecidos neste pleito.

Tendo em conta a factualidade do caso em apreço, indubitavelmente se chega à conclusão de que os cabos de alta tensão são necessários ao abastecimento das populações vizinhas de Lugar do Ermo, permitindo o fornecimento a hospitais e outros serviços públicos, assim como o desenvolvimento da actividade económica, representando assim um forte contributo para a qualidade de vida das mesmas.

Pois bem, no que tange ao contributo prestado pelo fornecimento de energia pela R.E.N., a verdade é que o fornecimento de energia trata-se de uma questão de satisfação interesse público, sendo que, o seu “corte” produzirá, inevitavelmente, consequências nefastas.

Na verdade, e na senda de RIVERO, o abastecimento de electricidade das populações vizinhas dá resposta a uma esfera de necessidades insuprível por via da iniciativa privada e vitais para a comunidade na sua totalidade e para cada um dos seus membros[6].

Como nos ensina o insigne administrativista ROGÉRIO SOARES[7], o conceito de interesse público é o interesse na justa composição dos conflitos, mediante a repartição, segundo critérios variáveis, de bens materiais e imateriais da sociedade, sendo certo que, no caso em apreço, a importância de abastecer as populações vizinhas é premente para a realização das necessidades colectivas.

Assim sendo, se por um lado do espectro encontramos a pretensa necessidade de proteger os direitos subjectivos dos 6 cidadãos do Lugar do Ermo, por outro se referirá o evidente interesse público na manutenção do abastecimento de electricidade às populações vizinhas.

Como refere MARIA DA GLÓRIA GARCIA[8], “a imagem de um Estado Ambiental como Estado que pura e simplesmente suprime a liberdade e o direito, em nome da defesa do ambiente, um Estado recomendado como terapia para as tensões civilizacionais e a degradação ecológica, é mais prejudicial do que os malefícios que procurava combater”.

Desta forma, a procedência dos pedidos dos autores apenas poderá ser pensado à luz de uma concepção preventiva algo “fundamentalista”, porquanto tal implicará a lesão de outros direitos e interesses, negando assim a própria ideia subjacente ao princípio da integração[9] que subjaz ao Direito do Ambiente.

Ao exposto se aduz, e porque tal se vislumbra relevante para dirimir o litígio em apreço, que a análise do problema deverá ser enquadrada à luz da “metódica da colisão de direitos”[10].

Em bom rigor, se se pode arguir a violação, à luz do artigo 66.º da Constituição, de direitos fundamentais ao ambiente, de igual modo se deverá referir o direito à habitação[11], enquanto direito de todos os cidadãos a condições de higiene e conforto, assim como o direito à saúde a que todos os cidadãos têm direito nos termos da Constituição[12].

Na verdade, uma quebra no abastecimento de electricidade, tal como supra referimos, impossibilitaria os hospitais que servem as populações vizinhas de continuarem a sua actividade, cerceando assim o direito dos residentes naquelas áreas de usufruírem das infra-estruturas médicas à sua disposição e, como tal, dificultando sobremaneira o acesso a cuidados de saúde.

De igual modo, o direito à habitação constitucionalmente consagrado, passa necessariamente pelo direito de todos os cidadãos a terem condições mínimas de conforto, sendo que, impedir o acesso das populações a electricidade, será o mesmo que condená-las aos tempos remotos medievais!

Poder-se-ia arguir, em detrimento do que foi dito, que qualquer quebra no abastecimento de electricidade seria sempre temporária e, com tal, transitório.

A isto se apõem dois argumentos: i) o licenciamento da presente instalação de electricidade demorou cerca de dois anos, sendo que, alterações de raiz no sistema de abastecimento eléctrico implicarão um novo procedimento administrativo, com a morosidade que lhe é inerente; ii) os autores apenas pedem o corte de energia, não tendo ficado provado a existência de qualquer outra alternativa viável ao presente sistema.

Do exposto facilmente se retira, e em consonância com o interesse público a que já fizemos referência, que a satisfação do direito subjectivo ao ambiente dos 6 habitantes de Lugar do Ermo (direito esse que consideramos não ter ficado provado a sua lesão), colidirá necessariamente com os direitos subjectivos das habitantes das povoações vizinhas, verificando-se assim um verdadeiro conflito entre direitos constitucionalmente consagrados de igual valor.

Ainda que tal argumento não seja procedente, nomeadamente por considerar inexistente a colisão de direitos no caso em apreço, e como tal adoptando uma noção estrita dos mesmos, mais se acrescenta que tal colisão poderá verificar-se, como refere GOMES CANOTILHO[13], entre direitos fundamentais e bens jurídicos da comunidade.

No caso em apreço, caso seja impedido o fornecimento de electricidade, poder-se-á perigar a “saúde pública”, um bem jurídico valioso, considerado digno de protecção jurídica pelo nosso ordenamento e constitucionalmente garantido.

Por maioria de razão e tendo em conta o exposto, debalde se poderá encontrar qualquer fundamento jurídico para a interrupção de energia, sendo por de mais evidente que a procedência dos pedidos da A., além de profundamente lesivo para o interesse público colide necessariamente com os direitos subjectivos constitucionalmente consagrados dos habitantes das populações vizinhas.

IV
DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO MEI

A A. peticiona a condenação do MEI no pagamento de uma indemnização no montante de € 250.000,00, a título de responsabilidade civil extracontratual, subjectiva ou, ainda que assim não se entenda, objectiva.

Os pressupostos da responsabilidade civil subjectiva da Administração Pública em matéria ambiental são: (i) o facto ilícito, (ii) a culpa, (iii) o prejuízo, (iv) o nexo de causalidade entre o facto e o prejuízo (VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, Almedina, 2003, pp. 257 e seguintes)

Quanto ao facto ilícito, sempre se dirá que não ficou provada a ilegalidade da atribuição de licença pela DGEG à REN para instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão, porquanto:
a) o pedido de licenciamento foi entregue aquela entidade em 18 de Maio de 2004, acompanhado do Estudo de Impacto Ambiental, conforme documentos juntos aos autos pela REN e depoimento da testemunha Senhora Eng.ª Marlene Paiva, que acompanhou de perto todo o processo na qualidade de trabalhadora da REN, integrando a equipa responsável pelo projecto em questão;
b) a DGEG remeteu a Agência Portuguesa do Ambiente o Estudo de Impacto Ambiental e, subsequentemente, foi nomeada uma comissão de avaliação, conforme depoimento da testemunha Senhora Eng.ª Marlene Paiva;
c) após a reformulação do projecto pela REN por forma a incluir a possibilidade de as linhas de muito alta tensão serem subterrâneas e o parecer negativo do Instituto Português de Arqueologia e de um habitante do concelho de Lugar do Ermo na sequência da publicação do anúncio referente ao Procedimento de Avaliação do Impacto Ambiental no jornal do Concelho do Abandono e afixação de editais na freguesia de Lugar do Ermo, a comissão de avaliação, em Novembro de 2005, emitiu parecer favorável condicionado à construção aérea das referidas linhas, conforme resultou dos depoimentos das testemunhas Senhor João Carvalho (que afirmou ter lido o anúncio no jornal do Concelho de Abandono), Senhor João Portugal (que afirmou ter visto o anúncio afixado em editais no Lugar do Ermo) e Senhora Eng.ª Marlene Paiva;
d) a proposta de Declaração de Impacto Ambiental que continha tal parecer favorável condicionado foi posteriormente remetida ao Ministério do Ambiente, em Dezembro de 2005, sem que este tenha respondido à mesma, até à presente data, conforme resultou da prova documental junta aos autos pela REN e do depoimento da testemunha Senhora Eng.ª Marlene Paiva;
e) foi proferido despacho pelo Director Geral de Energia e Geologia em 12 de Maio de 2006, emitindo a licença requerida, conforme documento junto aos autos pela REN e depoimento da testemunha Senhora Eng.ª Marlene Paiva.

No que concerne aos danos, tomando em consideração a noção de dano ambiental por recurso à noção de ofensa ecológica, como “todo o acto ou facto humano, culposo ou não, que tenha como resultado a produção de um dano nos componentes ambientais protegidos por lei” (FREITAS DO AMARAL, Análise Preliminar da Lei de Bases do Ambiente, in: Textos – Ambiente, CEJ, 1994, p. 249), é forçoso concluir que a A. centrou o seu pedido de responsabilização do MEI em danos que não assumem tal natureza, como sejam:
a) alegadas queixas de mau estar, náuseas e cefaleias por parte dos habitantes de Lugar do Ermo e de pessoas que visitaram o local;
b) doenças de foro oncológico alegadamente causadas pelos campos electromagnéticos;
c) desvalorização de terrenos; e
d) decréscimo da actividade turística.
Tais danos foram, aliás, desmentidos pelo depoimento do Senhor João Carvalho e, relativamente aos mencionados em b) supra, pela Senhora Dr.ª Lourivânia Lacerda.
Por outro lado, no que respeita aos danos ambientais alegados, estes resumem-se aos seguintes: ruído, abandono em massa de aves e desequilíbrio do ecossistema através da proliferação de répteis e insectos. De igual modo, não foi possível alcançar sequer um grau de certeza de verificação dos mesmos danos, porquanto o depoimento da testemunha Senhor João Carvalho, residente em Lugar do Ermo, negou-os veementemente e Senhora Professora Carolina Ferreira não soube precisar no tempo a instalação da linha de muito alta tensão e a verificação dos alegados danos.

No caso em apreço, ainda que se encontrassem verificados os alegados prejuízos (o que apenas se admite por cautela de patrocínio) – designadamente, a lesão do ecossistema, o aumento de doenças nos animas e na população residente no Lugar do Ermo, o ruído, as cefaleias dos habitantes e turistas de Lugar do Ermo e a leucemia da criança residente em Lugar do Ermo -, certamente não se verifica o nexo de causalidade entre a instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão e os alegados prejuízos, porquanto existe todo um conjunto de circunstâncias externas que podem ter contribuído para a produção dos alegados prejuízos, isoladamente ou em concurso com o funcionamento da linha de muito alta tensão (fenómeno de causalidade cumulativa ou alternativa), designadamente:
a) as condições meteorológicas, passíveis de terem originado movimentos migratórios dos tucanos e papagaios;
b) as patologias víricas cujos sintomas se aproximam de cefaleias;
c) a poluição atmosférica causada pela circulação automóvel pelos cerca de 20.000 turistas que anualmente visitam Lugar do Ermo, conforme resultou do testemunho do Senhor Dr. André Paula e do testemunho do Senhor João Carvalho;
d) o estado das águas que abastecem o Lugar do Ermo, cuja hipótese de contaminação não ficou afastada, porquanto não existe uma rede pública de abastecimento de água, não existe saneamento básico e nenhuma das testemunhas residentes no Lugar do Ermo afirmou ter realizado análises à água que abastece as respectivas residências.

Acresce que os depoimentos das testemunhas Senhora Professora Carolina Ferreira e Senhor João Carvalho foram essenciais para atestar a inexistência do nexo de causalidade entre a leucemia de que padece o menino João Sequeira, residente em Lugar do Ermo, e a instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão, porquanto a doença terá sido detectada em 2005, antes da referida instalação, ao que acresce não existir qualquer outra criança (de entre as cinquenta que são alunas na escola de Lugar do Ermo) a quem tenha sido diagnosticada tal patologia, conforme os depoimentos da Senhora Professora Carolina Ferreira e Senhor Dr. André Paula.

Improcedem, de igual modo, os argumentos de ordem “estatística” (designadamente, os estudos juntos aos autos) invocados pela A. por forma a comprovar a elevada probabilidade de o funcionamento das linhas de muito alta tensão a uma distância inferior a 100 metros das habitações provocar danos na saúde das pessoas e no ambiente. Citando CARLA AMADO GOMES, “a Ciência enquanto guardiã da verdade, todavia, é um mito. A verdade científica está cada vez mais precária e as fraudes recentes (...) não lhe acrescentam credibilidade” (Risco e Modificação do Acto Autorizativo Concretizador de Deveres de Protecção do Ambiente, Coimbra Editora, 2007, p.758). Note-se, aliás, que “a ‘causalidade estatística’ não pode ser havida como critério de imputação de dano (...)”, não sendo aceitável como “critério imediato ou autónomo de averiguação do nexo causal” (ANA PERESTRELO DE OLIVEIRA, Causalidade e Imputação na Responsabilidade Civil Ambiental, Almedina, Coimbra, 2007, p. 65). Aceitar que a instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão causou tais danos porque há estudos e estatísticas que indicam que as mesmas são susceptíveis de os causar seria assumir que o nosso ordenamento jurídico abriu as portas à falácia da estatística, ignorando o caso concreto, pois que “questionada sempre é a causa do evento” (ibidem). Segundo MEDICUS (ibidem), uma responsabilidade fundada estatisticamente justificar-se-á muito mais facilmente, do ponto de vista prático e dogmático, caso se trate de um largo número de lesados, cujas diferenças individuais no conjunto são canceladas. Não é, manifestamente, o que sucede no caso em apreço, atentas as razões supra expostas e considerando o reduzido número de habitantes de Lugar do Ermo (seis, conforme resultou provado do depoimento da testemunha Senhor João Carvalho, em consonância com o enunciado do caso).

Ainda que se entenda ser de aplicar uma “presunção de causalidade” adequada – o que só fará sentido caso se admita ter existido uma actuação ilícita da demandada (VASCO PEREIRA DA SILVA, Verde Cor de Direito, Almedina, 2003, p. 70) -, não poderão ser desconsideradas as concretas circunstâncias que envolvem os alegados prejuízos e que, com elevado grau de probabilidade, os causam, por forma a obter a boa decisão da causa. Conforme frisa ANA PERESTRELO DE OLIVEIRA (ob. cit., p. 78), “pode, naturalmente, uma instalação em abstracto criar ou aumentar o risco de lesão do bem jurídico e em concreto não o ter criado ou aumentado”, gerando-se o problema de imputação do resultado ao agente, em violação dos mais basilares princípios que enformam o sistema jurídico da responsabilidade civil. No âmbito dos presentes autos não ficou provada a criação ou aumento de um risco para o ambiente em resultado da instalação e funcionamento da linha de alta tensão, tendo sido gerada a dúvida da existência de tucanos e papagaios em Lugar do Ermo, por força da contradição entre os depoimentos do Senhor João de Carvalho e da Senhora Professora Carolina Ferreira nesta matéria. Ao que acresce que não foi produzida qualquer prova adicional pela A. relativamente às demais alterações alegadas ao nível do ecossistema.

Sem prescindir, ainda que o critério adoptado pelo digníssimo Tribunal no âmbito da imputação dos alegados danos ambientais venha a assentar na “ideia central de risco”, a dificuldade de prova que impende sobre a A. não terá aptidão para, por si só, determinar alterações quanto ao grau de prova ou quanto ao seu próprio ónus da prova (ibidem, p. 70). Pelo que forçoso será concluir que, cumprindo à A. provar os danos alegados e o nexo que os une à instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão sem que tenha sido feita prova stricto sensu (ou seja, mediante a “certeza” - TEIXEIRA DE SOUSA, As Partes, o Objecto e a Prova, Lex, Lisboa, 1995, pp. 197 e seguintes) dos mesmos, deverá improceder o pedido de responsabilização do MEI por falta de tal pressuposto. Efectivamente, não fez a A. a demonstração de que a instalação e funcionamento da referida linha tenha criado ou aumentado um “risco não permitido” (responsabilidade subjectiva) ou de um “risco previsto na fattispecie legal “ (responsabilidade objectiva), pelo que não tendo sido feita tal demonstração, não deve o Tribunal presumir a materialização de tal risco (v. ANA PERESTRELO DE OLIVEIRA, ob. cit., pp. 75 e 95).

Ainda, sem prescindir, realce-se que a existir responsabilidade, no caso sub judice, do MEI pela prática do acto administrativo impugnado, sempre seria uma responsabilidade civil pela prática de um acto lícito que impôs encargos excepcionais aos concretos particulares afectados pela instalação e funcionamento da linha de muito alta tensão, nos termos previstos no artigo 9.º do D.L. n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, demonstrado que ficou o cumprimento dos trâmites legais do procedimento.

Por outro lado, o n.º 3 do artigo 48.º da Lei de Bases do Ambiente estabelece o pagamento de indemnização especial somente no caso de impossibilidade de reconstituição natural, e nunca cumulativamente, ao contrário do que foi peticionado pela A.. Sendo de rejeitar o pedido de reconstituição material no caso em apreço, em virtude do disposto nos artigos 45.º e 163.º do CPTA e por respeito aos princípio da proporcionalidade e separação de poderes, constitucionalmente consagrados, restaria a possibilidade de condenação do MEI no pagamento de uma indemnização, nos termos legais.

Quanto ao pagamento da referida indemnização a título de responsabilidade civil extracontratual objectiva do MEI, não poderá este douto Tribunal olvidar-se do facto de a A. ser uma associação de direito privado que impulsionou os presentes autos enquanto defensora do direito ao ambiente, à saúde e qualidade de vida dos seis habitantes de Lugar do Ermo.
e)
Nessa medida, não deixará a referida associação de ser considerada, para o efeito do pedido de responsabilização do MEI e da respectiva condenação no pagamento de uma indemnização globalmente fixada, parte ilegítima, dando lugar à absolvição da instância nos termos do artigo 89.º, n.º 1, al. d) e n.º 2 do CPTA.

Ainda que assim não se entenda, salvo o devido respeito, sempre terá a A. ido demasiado longe ao peticionar o pagamento de uma indemnização de € 250.000,00 que ingressará no seu próprio património, sem qualquer garantia de ressarcimento dos alegados danos provocados ao nível das posições jurídico-subjectivas individuais dos concretos habitantes de Lugar do Ermo. Efectivamente, verifica-se a “confusão entre a tutela objectiva da legalidade e do interesse público, que é realizada pela acção popular, e a tutela jurídico-subjectiva, para a defesa dos direitos ou interesses próprios, que é realizada pelo direito de acção dos titulares de direitos subjectivos“ nos termos dos artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (VASCO PERERIRA DA SILVA, ob. cit., p. 270). Confunde a A., assim, o seu direito de exercer a acção popular no intuito da defesa da legalidade e do interesse público, enquanto legitimidade de agir em juízo, com o ressarcimento de um dano que, a verificar-se, não se verificou na sua esfera jurídica. Aliás, por serem individualmente identificáveis os concretos lesados (os seis habitantes de Lugar do Ermo) que sofram ofensas no seu direito a desfrutar de um ambiente sadio e equilibrado, não faz qualquer sentido que a referida indemnização, a ser atribuída, o seja ao actor popular que, nessa medida, enriquecerá o seu património à custa de uma lesão na esfera jurídica individual daqueles habitantes. Igual raciocínio se aplica no caso de se tratar unicamente da defesa do interesse público, porquanto, mesmo nessa situação, não se compreende o enriquecimento do património de uma associação de âmbito territorialmente delimitado à custa de uma alegada lesão do ambiente que afecta toda a comunidade.


Mesmo que assim não se entendesse – ou seja, que não fossem individualizáveis os concretos lesados -, em última ratio, sempre se dirá que o ambiente é um bem jurídico unitário respeitante a toda a comunidade nacional. Em conformidade, o titular do direito ao ressarcimento pelos danos causados ao bem ambiente deverá ser o ente representativo dessa comunidade – o Estado. A opção por uma concepção do direito do ambiente como direito humano colectivo, em que o Estado é o único titular do direito à indemnização por danos ambientais é compreensível, uma vez que é seguramente a Administração Pública quem se encontra em melhores condições para tomar medidas que permitam, de alguma forma, reparar os efeitos nocivos de um atentado ao ambiente.
Pelos argumentos supra expostos, deve improceder, também, na totalidade, o pedido de condenação do MEI no pagamento de indemnização à A., a título de responsabilidade civil extracontratual.



[1] Cfr. Constituição da República Federativa do Brasil, artigo n.º 225
[2] Apesar de no caso espanhol o contexto doutrinal e jurisprudencial ser algo complexo, sendo que, existem inúmeros autores com entendimento contrário à “subjectivização” do direito ao ambiente.
[3]GOMES CANOTILHO, Introdução ao Direito do Ambiente, Universidade Aberta, Lisboa, 1998
[4] cfr. artigo 9.º, alíneas d) e e)
[5] Cfr. artigo 362.º do Código Civil e 523.º do Código de Processo Civil
[6] JOÃO MELO ANTUNES/HERLANDER ANTUNES MARTINS, Dicionário de Conceitos e Princípios Jurídicos, Coimbra, 1988
[7] ROGÉRIO SOARES, Interesse Público, Legalidade e Mérito, 1978
[8] MARIA DA GLÓRIA GARCIA, O Lugar do Direito na Protecção do Ambiente, Coimbra, 2007, pp. 34 e ss..
[9] A própria noção de “ecologia”, tal como foi formulada inicialmente por ERNST HAECKEL, foi definida como “a ciência das relações dos organismos com o mundo exterior, no qual nos podemos reconhecer como factores de luta pela existência”, o que aponta para uma disciplina de síntese, remetendo para uma ideia de globalidade e concertação de interesses.
[10] Sobre esta matéria, cfr. J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 2002
[11] Cfr. Artigo 65.º, n.º1 da Constituição.
[12] Cfr. Artigo 64.º da Constituição.
[13] J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 2002

Grupo que realizou o trabalho:
Carlos Vaz de Almeida
Cristiana Ferreira
Cláudia Quintino
Gisela Andrade
Lourivânea Lacerda
MArlene Paiva
João Carvalho

Bom Natal!

Um Santo Natal e Um Felicíssimo 2008 para todos!
Também um muito obrigado pelo privilégio da vossa presença na académica epopeia que ora empreendemos!

Até para o ano! Felicidades!