quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Tribunal Administrativo e Fiscal de Flora




EXMOS. SRS. JUÍZES DE DIREITO,



A Associação “Lugar do Ermo”, pessoa colectiva de direito privado, com o n.º 123 456 789, com sede na Rua das Flores nº 69, 2ª cave, 4000-123 Flora, Freguesia da Fauna, Conselho da Flora, Lugar do Ermo, registada sob o mesmo número no Registo Nacional de Pessoas Colectivas,

vem, nos termos do artigos 112.º, n.º 1 e 55.º, n.º2, alínea f), ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), requerer a adopção de providência cautelar conservatória, contra

Ministério do Ambiente, sito na Rua do Século, n.º 51, 1200-433 Lisboa

A Demandante vem ainda requerer que Vossas Exas. se dignem ordenar a citação da REN - Redes Energéticas Nacionais, SGPS, S.A (doravante REN) com domicílio na Avenida dos Estados Unidos da América, n.º 55, 1749-061 Lisboa, na qualidade de contra-interessados.


O que o faz nos seguintes termos:


I. Dos Factos



O transporte da energia no território nacional é explorado pela Rede Eléctrica Nacional (REN).


A REN colocou, no ano 2006, diversos cabos de alta tensão que atravessam a povoação de Lugar do Ermo.


Esta colocação não foi precedida do necessário estudo e respectiva declaração de impacto ambiental favorável.


Os referidos cabos passam por cima de vários edifícios de habitação e também de uma escola, fazendo elevado e constante ruído, devido à passagem de energia pelos cabos.


Um estudo científico recente da Universidade de Oxford, no Reino Unido, publicado no British Medical Journal, que conclui existir um aumento de 70% (setenta porcento) das probabilidades de contrair leucemia em crianças que vivem a menos de 200 m (duzentos metros) de linhas de alta tensão, que protesta juntar na Petição Inicial.


Na Encosta de São Marcos no Concelho de Sintra, onde passam os cabos de alta tensão, surgiram dez novos casos de cancro.


Desde 2006 é comum a todos os habitantes de Lugar do Ermo queixarem-se de mal-estar e cefaleias severas, conforme relatórios médicos que protesta juntar na Petição Inicial.


Há inclusivamente o caso grave de uma criança a quem foi diagnosticado uma patologia do foro oncológico, conforme documento que protesta juntar na Petição Inicial.


O Lugar do Ermo situa-se num ambiente campestre e rural, sendo património cultural, qualificado como área de interesse nacional pela Rede Natura 2000, nos termos das Directivas Aves e Habitats.

10º
Lugar do Ermo é um destino turístico famoso, recebendo cerca de 20.000 (vinte mil) turistas por ano, assim como diversos acampamentos de escuteiros.

11º
Diversos turistas que visitaram Lugar do Ermo demonstraram sintomas similares aos demonstrados pelos habitantes locais.

12º
A partir de 2006, o Centro de Saúde de “Lugar Perto do Lugar do Ermo” registou um número anormal de doentes com dores de cabeça e náuseas.


II. Do Direito


13º
É inevitável afirmar a relação manifesta entre a instalação dos referidos cabos e os variados sintomas demonstrados, tanto pela população local como pelos turistas que visitaram Lugar do Ermo, já que estes últimos apenas começaram a revelar os referidos sintomas desde 2006, ano em que foram instalados os cabos.

14º
A Demandante vem solicitar que V. Exas. se dignem ordenar a presente providência cautelar, antecipando, ou assegurando a utilidade da sentença da respectiva acção especial de impugnação de acto administrativo, a instaurar, no douto Tribunal, contra o Demandado.

15º
Demonstrada que ficou já a legitimidade activa da Demandante, quanto à legitimidade do Demandado, cabe referir o art. 10.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), que atribui assim legitimidade ao Ministério do Ambiente.

16º
A Demandante pretende pois solicitar a adopção de uma providência cautelar conservatória, com vista a assegurar a utilidade da sentença, na medida em que pretende prevenir um dano irreversível, como sejam as doenças inerentes aos sintomas supra referidos, provocadas pelas linhas de alta tensão e assegurar que a futura nulidade e ineficácia do acto administrativo (licença) tenha utilidade efectiva, nos termos do art. 112.º, n.º 1 do CPTA.

17º
A referida providência cautelar é conservatória na medida que a Demandante pretende restabelecer a situação em que se encontrava a população antes da edificação e posterior funcionamento das linhas de alta tenção.

18º
Entende a doutrina maioritária e a melhor jurisprudência que, pela expressão “conservatória” deve considerar-se a conservação da situação antes do litígio em causa; sendo que, neste caso, a situação anterior ao litígio, é aquela que existia até ao preciso momento em que a REN colocou os referidos postes de alta tensão e deu início ao funcionamento dos mesmos (e não o momento em que a Petição Inicial, da qual esta providência dependerá, dará entrada no Tribunal); ou seja com esta providência cautelar conservatória pretende-se regressar ao “status quo ante”.

19º
Mais concretamente, pretende-se pela presente suspender a eficácia do acto administrativo, isto é, da licença emitida pelo Ministério do Ambiente, que concede à REN a autorização para a edificação e funcionamento das linhas de alta tenção em Lugar do Ermo, nos termos do art. 112.º, n.º 2, alínea a) do CPTA.

20º
Sucede que o licenciamento não foi precedido da respectiva e obrigatória avaliação de impacto ambiental, o que leva à nulidade do acto administrativo que o concedeu, nos termos do art. 1.º, n.º 2 conjugado com o art.19.º do Anexo I e do art. 20.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 69/2000 de 03 de Maio, e ainda do artigo 30.º, n.º 1 e 3 da Lei de Bases do Ambiente.

21º
É clara a procedência da pretensão a formular na acção principal, mediante um juízo de prognose, na medida em que, com base no supra mencionado, a licença a impugnar é manifestamente ilegal, pela falta do estudo de avaliação de impacto ambiental, ficando assim provado o “fumus boni iuris” (excepcional), ou seja “aparência do bom direito”, constante do art. 120.º, n.º1, alínea a) do CPTA.
22º
A título subsidiário, considera-se provado, na sequência do supra mencionado, o “fumus boni iuris” (de carácter negativo), nos termos da alínea b) do citado preceito.

23º
Quanto ao “periculum in mora”, nos termos do art. 120.º, n.º1, alínea b) do CPTA, encontra-se provado, uma vez que existe um evidente e fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação.


24º
Exige ainda o n.º 2 do art. 120.º do CPTA que na adopção das providências cautelares se observe o princípio da proporcionalidade, ou seja deve ponderar-se se as consequências da suspensão da eficácia do acto são superiores ao alcance da gravidade das consequência da recusa da suspensão.

25º
Deste modo, importa proceder ao “contrapeso” entre os bens jurídicos do ambiente e da saúde, de um lado, e o interesse público resultante da circulação da energia, do outro.

26º
Mais, resulta que os interesses em presença são ambos interesses públicos poderosos, mas não de “dignidade” idêntica.

27º
A exigência de uma protecção célere e atempada dos interesses jurídico-ambientais descurados pela obra de edificação dos postes de alta tensão está a causar danos irreversíveis na saúde dos moradores.

28º
Há outras redes que possam substituir a emissão de energia, nomeadamente uma rede subterrânea de cabos, pelo que é possível conseguir um maior equilíbrio, com um mínimo de sacrifício por parte dos cidadãos que usufruem das linhas.

29º
A Requerente pede ainda a Vossas Exas. que a execução do acto não prossiga, nos termos do art. 128.º, n.º 1 do CPTA, uma vez que, pelas razões supra mencionadas, não há grave prejuízo para o interesse público.

30º
Apesar de a energia circular já nos cabos em questão, ou seja há já execução do acto administrativo, tal não é impedimento à suspensão da eficácia da licença em causa, nos termos do art. 129.º do CPTA, pois é evidente a utilidade no que toca os efeitos do acto que ainda produza.

31º
Urge impedir o prosseguimento dos efeitos da licença, de forma a evitar danos irreversíveis na população de Lugar do Ermo e ainda assegurar o efeito útil da possível sentença de impugnação da mesma, em sede da acção principal.

32º
O carácter urgente, exigido para as providências cautelares, justifica-se pelos sintomas revelados pelos habitantes de Lugar do Ermo, pelas possíveis consequências de patologias graves e ainda pelo facto de bens jurídicos, como o Direito ao Ambiente e o Direito à Saúde serem direitos fundamentais de natureza análoga a direitos, liberdades e garantias, com o fundamento do art. 17.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).




A ora Requerente vem requerer a Vossas Exas. se dignem instaurar uma providência cautelar de suspensão da eficácia do acto administrativo, nos termos do art. 112.º, n.º 1 e 2, alínea a) do CPTA, acompanhada da respectiva proibição de prosseguimento da execução do acto administrativo, nos termos dos arts. 128.º e 129.º ambos do mesmo.




JUNTA: cópias legais e procuração forense.


TESTEMUNHAS:

- Selma Rebêlo, solteira, portadora do Bilhete de Identificação n.º 24783083, residente em Palma de Cima, universidade Católica Portuguesa;

- Carolina Ferreira, casada, portadora do Bilhete de identificação 27638497, residente na Rua de Santo Antão, n.º 44, Lugar do Ermo;

- André Paula Santos, viúvo, portador do Bilhete de Identificação, n.º 27649465, residente na Rua das Flores, n.º 22, sítio da Flora;

-João Portugal, solteiro, portador do Bilhete de Identificação n.º 83548569, residente na Avenida Herbário, n.º 4, Fauna;


O (s) Advogado (s)


Hugo Santos Ferreira
Jorge Bernardino
Margarida A. Oliveira
João Guerra

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