sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Querem plantar uma árvore?

A propósito do tema, articulação do ambiente e qualidade de vida com o sistema económico, podemos encontrar algumas actividades, por enquanto, marginais, mas que talvez apontem no sentido de se verificar no mercado alguma sensibilidade para a urgente necessidade dessa articulação.

1- Inserida na filosofia de “usar uma empresa para projectos ecológicos” foi criada a comunidade ecológica na Internet, http://www.tree-nation.com/.

Esta comunidade espanhola, com fins lucrativos, tem a seu cargo o projecto ecológico de plantar oito milhões de árvores no país mais pobre do mundo, o Níger, com o objectivo de combater a desertificação e o aquecimento global.

A concretização desta pretensão passa pela inscrição no site ou pela compra virtual directa de árvores por qualquer pessoa de qualquer país, para serem plantadas naquele país, de forma a aumentar a produtividade da terra e contribuir para a regeneração do solo.

Pode-se comprar desde Acácias de Senegal, por 10 euros, até Baobás por 75 euros.

As árvores serão plantadas num campo com a forma de coração gigante “ como símbolo de respeito e amor pela Terra” com o apoio local de silvicultores do Instituto nacional de Investigação Agrónoma do Níger.

Os proprietários das árvores poderão localizá-las virtualmente através de mapas on line.

Até ao momento já foram plantadas mais de 3.000 árvores, por mais de 12 mil utilizadores.

Curiosidade: adivinhem qual o país mais representado nestas aquisições? Portugal, seguindo-se os EUA.

Claro que esta iniciativa é de louvar, contudo será legítimo também questionar como reagirá o ecossistema em causa, assim como os ecossistemas vizinhos com uma intervenção deste nível?

2 - A segunda actividade relaciona-se com um assunto desagradável, e para alguns talvez incómodo mas, inevitável, pelo que me parece que deverá ser equacionado com alguma frontalidade exigindo alguma reflexão.

Estou a falar de FUNERAIS VERDES.

O funeral é um ritual que como tal assume diferentes contornos consoante a época, cultura e religião onde é praticado.

A principal função pode dizer-se que se traduz na manifestação de "respeito aos mortos", protegendo os restos mortais da natural devassidão dos necrófagos, permitindo a passagem do morto para uma nova etapa (para as culturas que acreditam na vida após a morte) e ajudando a família a lidar com a dor da perda do ente querido.

Cumpre também uma função de saúde pública, uma vez que após a morte o cadáver começa a decompor-se, produzindo odores, libertando gases e atraindo todo um conjunto de bactérias que irão participar na decomposição e são úteis para o morto, mas não certamente para os vivos.

Talvez num esforço de afastar a morte, preservando ao máximo o corpo, (à parte de considerações religiosas que fogem ao tema) vulgarizou-se o embalsamamento, contudo este método só se revela como eficiente na prática egípcia, que remove a totalidade órgãos por onde começa a decomposição.

Nos Estados Unidos da América com a guerra civil este método foi usado para enviar os soldados mortos no regresso para as suas famílias e o sangue imagine-se, que se decompõe rapidamente, era substituído por ... whiskey! Porque mais eficiente e barato que este liquido, passou a utilizar-se arsénico. Contudo devido aos níveis de contaminação que já se faziam sentir com esta utilização ela foi proibida (os corpos desapareceram, mas o arsénico não!).
Foi então substituído pelo formaldeído (da mesma família química da baquelite, primeiro plástico produzido pelo homem). Descobriu-se recentemente que se transforma, com a oxidação em ácido fórmico, envenenando os lençóis freáticos.

Para além dos produtos químicos necessários para este acto, a opção fúnebre mais recorrente revela-se também com uma grande fonte de poluição, os caixões.

Muitos são autênticos sarcófagos feitos de metais como bronze, cobre puro, aço inoxidável, ou mesmo de madeiras exóticas que se estima que causam o abate de 142 milhões de metros cúbicos de madeira, que é assim retirada da superfície para ser enterrada no sub solo!
Para além do material principal, as urnas envolvem vernizes plásticos e tecidos sintéticos, pregos e tudo isto é enterrado no solo e absorvido pelos lençóis de água.

Ou seja nem a morte está isenta de responsabilidade ambiental.

Sensíveis a este problema surgiram no Reino Unido várias empresas que prestam Funerais Verdes, isto é com caixões biodegradáveis, de cartão ou vime, com corpos não embalsamados, envoltos em mortalhas e colocados directamente no solo para libertarem os nutrientes directamente para a terra e no lugar da lápide, sugerem a plantação de árvores ou arbustos alimentados por aqueles nutrientes ou mesmo “chips” electrónicos para identificarem o local.

Estes funerais verdes para além de evitarem o impacto de todos aqueles materiais no sub solo e lençóis freáticos, contribuem para a ideia, um pouco lúgubre talvez para nossa cultura mediterrânica, de preservação de zonas verdes uma vez que quando esses “cemitérios” ficam cheios são transformados em reservas ou parques de lazer
No Reino Unido dez por centos dos cemitérios são “verdes” e nos Estados Unidos começa a ser uma prática com sucesso considerável.

O mais interessante é que esta alternativa têm sido efectivamente objecto de promoção empresarial e é muito mais barata, pelo menos no RU e EUA, que os procedimentos clássicos. Ou seja aparentemente o que move esta nova prática é o objectivo ambiental e não o económico.

Portugal não está alheio a esta nova prática. Existe pelo menos uma empresa, que já utiliza urnas ecológicas, substituindo pregos por colas naturais feitas à base de farinha e água, aplicando verniz não poluente e usando pegas amovíveis em vez das alças de metal, com os interiores em fibras naturais.

Nas cremações, a que cada vez mais se recorre, apesar representar uma prática bastante condicionada por se ter entendido que era inimiga do ambiente, utilizam-se urnas biodegradáveis para cinzas, feitas em cartão reciclável que pode trazer terra e sementes de pinheiro, para que quando for enterrada, caso seja essa a vontade dos familiares, possa dar origem a uma árvore.

Contudo, mesmos ultrapassados os problemas culturais que esta questão pode levantar, pode-se perguntar, e a saúde pública ficará assegurada? Bem queremos acreditar que técnicos responsáveis pela respectiva regulamentação terão acautelado tal aspecto.

Assim esta é mais uma actividade empresarial que, apesar de ter a morte como objecto, se está a articular com o ambiente e qualidade de vida.

Ainda este propósito e para finalizar a Associação Nacional de Empresas Lutuosas (ANEL) levanta uma questão interessante do ponto vista jurídico.

Defende esta associação que, face à saturação nos cemitérios (na Amadora, por ex., é necessário esperar oito dias por um “lugar”) a cremação é um bem necessário, para além de mais económico para as famílias e ecológico.

Mas na defesa do “funeral verde” vai mais longe, e aqui é que toca na questão, considerando que a urna ecológica é insuficiente para resolver os problemas fúnebres ambientais, há que pensar também na roupa do falecido. Sugere então que as câmaras municipais deveriam regular o que pode ir dentro do caixão com o corpo.

Deveriam regular o que vai dentro do caixão? Então e o próprio caixão? E o funeral? E a ser regulado deveria ser a câmara municipal?

Assim como até aqui razões de ordem de saúde pública e apelidadas ambientais, mandavam que as inumações, em regra, não pudessem ter lugar fora de cemitérios públicos, devendo ser efectuadas em sepulturas, jazigos ou locais de consumpção aérobia e em caixões com folha de zinco, deverá ou poderá, com fundamento nos atentados ambientais que essas práticas, afinal pretendiam evitar mas que alegadamente incrementam, o Direito interferir na questão cultural e delicada que está por trás do ritual do Funeral e consagrar como regra o funeral verde?

Rita Caceiro


Fontes: Imprensa diversa - DN, Publico, Portugal Diário
delegeagrariaextensa.blogspot.com
Alan Weisman-“O mundo sem nós”, ed. Estrelapolar

2 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns pelo ótimo texto. Fiquei sabendo sobre funerais ecológicos por meio do seriado americano "six feet under" e procurei informações na internet. Este texto foi o mais esclarecedor.

Anônimo disse...

Excelente texto. Queria saber sobre cremação e urna ecológica quando encontrei este blog com informações muito importantes e esclarecedoras. Parabéns!