segunda-feira, 5 de novembro de 2007

será a protecção do ambiente uma realidade plenamente atingivél sem a consideração do interesse económico?

Caros colegas,

Depois de ter introduzido o tema, venho agora desenvolvê-lo, dar a minha opinião e suscitar o debate.

Ainda que ao nível do ambiente e reconhecimento do mesmo como bem que urge proteger tenha ocorrido uma profunda alteração, a lógica do mercado mantém-se: a actividade produtiva continua a ter, e sempre terá como quadro de referência a optimização do lucro analisado pelo cálculo de custos e benefícios, vantagens e inconvenientes. É nisto que se traduz o interesse económico!
A título exemplificativo refira-se o facto de no Algarve não existirem esgotos a serem canalizados para a água porque isso arruinaria a industria turística (exemplo de exterioridade positiva).

Ora, esta lógica puramente economicista não aborda claramente nos seus custos nem nos seus inconvenientes o dano ambiental, maxime, a poluição que constitui um efeito externo de algumas actividades económicas.
Assim, perante esta "exterioridade" (a poluição) certamente negativa são afectados não apenas "os vizinhos" da actividade industrial como também, num segundo momento, toda a colectividade face à natureza global dos bens ambientais (exemplos da chuva ácida e chernobil).

Estes efeitos externos poderão ser evidentemente resolvidos, no quadro das relações fundamentalmente privadas, através do instituto relativo às relações de vizinhança e ao instituto da Responsabilidade, subjectiva ou objectiva, por actos ilícitos ou por mero risco.
No entanto, e como salientou bem Sousa Franco, estes institutos não são suficientes para resolver o problema da poluição nomeadamente porque não identifica o "pagador" dos custos necessários à redução dessa poluição, quer devam ser suportados pela colectividade quer pelos agentes autores da actividade que gera esse efeito externo negativo. Ou seja, o custo de proteger o bem ambiente tendo que ser suportado ou pela colectividade ou pelos agentes económicos, tem que ser determinado pelo Estado decidindo através critérios económicos, técnicos, de financiamento e de justiça.

Assim, restam duas opções:
· O custo de proteger o ambiente é suportado pelo agente económico poluidor (principio do poluidor-pagador);
· O custo de proteger o ambiente é protegido pela colecividade, pelos contribuintes.

No que diz respeito à solução preconizada pelo Principio do Poluidor-pagador e em traços muito gerais pois não é directamente o assunto que pretendo aqui abordar e suscitar a debate, este principio estabelece que o custo do sacrifício imposto a terceiros pela decisão do produtor seja por este contabilizada como custo de produção, o que levará a produzir menos do que produziria sem essa interorização, isto é a tomada da exterioridade (neste caso, a poluição) como custo de produção.
Este principio, na minha opinião tem toda a razão de ser uma vez que se partimos do entendimento que os bens naturais são limitados para restringir possíveis actuações agressivas, estes deixam de se distinguir dos bens económicos, e tendo estes sempre um custo, os outros também passam a tê-lo (ainda que neste caso o custo seja social).

Relativamente à opção de ser o contribuinte a suportar o custo de protecção do ambiente, no meu entender, estamos assim de alguma forma a conflituar com o "interesse económico" do contribuinte, que nem sempre estará disposto a agir custeando a protecção do meio ambiental.

A título de exemplo, refiro uma notícia publicada no Courrier internacional a 19 de Outubro que tinha um título muito interessante e reflector do meu ponto de vista: "Para salvar o planeta: comprem ar, não petróleo!"
Muito genericamente falando, a noticia diz respeito à proposta do presidente do Equador, que propõe não explorar uma imensa jazida petrolífera da Amazónia equatoriana, em troca de uma indemnização paga pelos países ocidentais.
As razões para não explorar petróleo prendem-se com o impacto ambiental negativo que tal exploração iria provocar e, nessa medida está em causa proteger os recursos naturais, a qualidade de vida de todos nós. Mas estaremos dispostos, estará o contribuinte individualmente considerado de cada país ocidental disposto a pagar o "preço do ar", através de um aumento dos combustíveis ou mesmo em virtude da canalização dos seus impostos para o pagamento dessa indemnização?

Ora, todos estes problemas enunciados são problemas da Economia Pública, a serem resolvidos pelos Estados.

Ao nível do Direito da Economia, entre as várias relações que se suscitam, creio que a mais interessante passa pela resolução do conflito entre liberdade de comércio e protecção do ambiente.
A regulamentação do acesso e o exercício da actividade económica, ainda que considerem minimamente a qualidade de vida ambiental, não estão de todo em sintonia com os custos que o direito ao ambiente poderá exigir.
Mesmo o direito económico dos recursos naturais, ainda que coincida com a finalidade ou com o critério do ambiente, no domínio da água, dos recursos hídricos, no domínio dos recursos mineiros, essa preservação pretende proporcionar recursos produtivos à actividade económica, divergindo da função do direito ao ambiente que preocupa-se em criar condições equilibradas à vida humana, não considerando assim a utilização produtiva na actividade económica como única finalidade possível da protecção dos recursos naturais.

Ainda neste último domínio, gostaria de fazer referência como por vezes o direito ao ambiente, economicamente conseguido através por exemplo das energias renováveis pode colocar em causa o direito individual de cada um, quando por exemplo, a construção e manutenção de aerogeradores impliquem uma violação do direito de fruição ambiental pelo ruído causado entre outros danos (mas claro está neste caso, estamos no quadro das relações de vizinhança).

E, por outro lado, o ambiente muitas vezes poderá ser desconsiderado pela própria Administração, quando por exemplo uma autarquia, perante o desenvolvimento económico e cultural que o estabelecimento de uma determinada actividade económica no seu município comportará, faz de tudo para conseguir que essa actividade, ainda que prejudicial ao ambiente, se estabeleça no seu território.
Refira- se a este respeito a polémica de construção do Ikea na área do Minho, numa zona classificada de Reserva Ecológica Nacional (ainda que neste caso a questão seja substancialmente diferente, interessando para uma análise da importância económica do desenvolvimento de certas actividades económicas)

Assim enunciado o problema, questiono-me: como poderá sobreviver o direito ao ambiente e a sua protecção, como fins últimos, sem equacionarem a problemática do interesse económico?
Talvez seja dar demasiada importância à economia("it's the economy, stupid!", frase celebre na campanha de Bill Clinton contra Bush), não reconhecendo que o direito ao ambiente possa vingar per si.
Mas em todo o caso ele tem que ser considerado nas políticas e instrumentos ambientais para que a protecção do ambiente possa ser uma realidade atingível, sem excessivos custos e sacrifícios no desenvolvimento económico e cientifico -tecnológico.

Assim, no quadro do desenvolvimento sustentável coloco a questão de como a Avaliação do Impacto Ambiental poderá considera-se um verdadeiro instrumento de desenvolvimento sustentável, apesar de não serem contempladas as suas vertentes económicas?

fontes:
"o Principio do Poluidor-Pagador", por Mestre Isabel Marques da Silva, em "Estudos de Direito do Ambiente", sessões do seminário de 2002 de Direito do Ambiente

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