Na senda do desafio lançado pela colega (Dra. Gisela Andrade), venho, por este meio, apresentar algumas considerações sobre o princípio do poluidor-pagador.
O princípio do poluidor-pagador, enquanto visão algo economicista do bem jurídico Ambiente, apresenta um conteúdo manifestamente controverso na doutrina jurídica, assim como na política nacional e internacional.
A polémica em torno do princípio supra referido poder-se-á reconduzir, como refere JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS[1] a duas grandes pré-compreensões da tutela jurídica do ambiente:
1. pré-comprennsão antropocêntrica, onde a defesa do ambiente é encarada essencialmente sob o prisma da defesa da vida humana;
2. pré-compreensão ecocêntrica, onde o ambiente deve ser “(...) tutelado em si mesmo, procurando-se a defesa e promoção da natureza como um valor novo”.
Às visões que anteriormente referimos, importa, tendo em conta a análise da matéria suscitada, aduzir a chamada pré-compreensão económicocêntrica, na qual a protecção do ambiente encontra a sua explicação numa exploração racional de recursos escassos e imprescindíveis à continuação da actividade produtiva do homem, posição esta que tem vindo a ganhar preponderância em vários países, nomeadamente pela consagração expressa do princípio em análise nas legislações nacionais.
À partida, a muitos repugnará a ideia de uma comercialização do meio ambiente, assim como uma visão da intervenção nesta área que seja estritamente “paliativa”. Em boa verdade, muitos consideram que a utilização deste princípio enformador deverá ser sempre marginal, na medida em que se situa a jusante do problema da protecção do ambiente.
Para que se possa compreender a importância do princípio do poluidor-pagador, dois pressupostos deverão ser tidos em consideração com vista a uma análise cabal do problema:
1. Para uma visão integrada do princípio do poluidor-pagador não se pode esquecer que este coexiste com outros princípios com os quais interage em maior ou menor medida;
2. Qualquer análise que desconsidere o factor económico enquanto elemento de ponderação nesta matéria, só pode ser apelidado de ingénuo (perdoem-nos a franqueza).
Não esquecendo que a formulação do princípio, inicialmente, foi formulado segundo a ideia de quem causa um dano é responsável e deve suportar a reparação do dano, a verdade é que este não é passível de ser reconduzido unicamente a esta visão, antes apresentando um campo de aplicação bastante mais abrangente. Um pensamento contrário a este reconduzir-nos-ia a uma identificação natural entre o princípio do poluidor-pagador e a responsabilidade civil no âmbito do Direito do Ambiente (dever-se-á aqui distinguir o princípio da responsabilidade do princípio do poluidor-pagador). Esta, segundo cremos, não será a visão mais acertada...
A prossecução de qualquer actividade produtiva passa, quase necessariamente, por consequências ambientais que deverão, sempre que relevantes, ser atendidas. Tendo em conta o custo social que estas representam, o princípio do poluidor-pagador pode desempenhar funções essencialmente preventivas e de redistribuição dos custos do poluidor-pagador.
Se, aos poluidores, não forem dadas outras alternativas a não ser deixar de poluir ou ter de suportar um custo económico em favor da comunidade, então os poluidores passarão a ter em consideração a poluição e os seus custos de oportunidades, escolhendo a opção mais vantajosa.
Desta forma, passando a encarar-se a poluição como custo de produção, passa a haver uma "internalização" do princípio do poluidor-pagador que em tudo beneficia uma efectiva tutela preventiva do Ambiente.
A operacionalidade prática deste princípio, no entanto, passa necessariamente, e à luz do próprio enquadramento constitucional português, pela proporcionalidade dos meios utilizados.
Assim, o valor a suportar pelos poluidores, deverá ser sempre proporcional à poluição que emitem, na medida em que qualquer desproporcionalidade pode traduzir-se em consequências profundamente adversas. A título de exemplo, pense-se numa medida estadual muito pouco onerosa para um poluidor. A consequência óbvia desta medida seria obviamente a sua ineficácia, já que, não reveste uma importância verdadeiramente preponderante. A contrario sensu uma medida excessivamente onerosa poderá impedir um funcionamento normal do tecido económico, representando um desvio face ao ponto óptimo social.
Como refere MARIA ALEXANDRA ARAGÃO, “(...) o legislador deverá alterar o montante dos pagamentos a efectuar pelo poluidor, até conseguir que ele adopte o comportamento-resposta considerado desejável”[2].
Tendo em conta o exposto, podemos considerar, nomeadamente enquanto “coadjuvante” do princípio da prevenção, que o resultado alcançado pela aplicação do princípio do poluidor-pagador pode apresentar resultados bastante vantajosos, permitindo a redução da poluição para níveis aceitáveis e também a criação de verbas necessárias ao combate efectivo à poluição, nomeadamente em sede de práticas correctivas (infelizmente frequentemente necessárias).
[1] JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, Direito Constitucional e Administrativo do Ambiente, Cadernos do CEDOUA, Almedina, 2002
[2] MARIA ALEXANDRA ARAGÃO, Direito Comunitário do Ambiente, Cadernos CEDOUA, Almedina, 2002
terça-feira, 6 de novembro de 2007
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