quinta-feira, 1 de novembro de 2007

E SE DE REPENTE DESAPARECÊSSEMOS?

Alan Weisman, jornalista norte-americano que se tem dedicado ao estudo das questões ambientais, equaciona a resposta a esta questão, no livro “O mundo sem nós” ( v.o. The world without us), cuja versão portuguesa foi editada a semana passada pela Estrelapolar.

Partindo de várias hipóteses teóricas (de difícil concretização, desde já se adianta) faz o exercício criativo de imaginar como seria a Terra se, num amanhã próximo, não ocorrendo quaisquer calamidades naturais que levassem ao fim do Mundo, a raça humana e somente esta, se fosse extinguindo ou pura e simplesmente, PUFF!!!, desaparecesse.

Como reagiria a Natureza sem a nossa pressão?
Voltaria o clima a ser o mesmo que existia antes da Revolução Industrial?
Que animais se proliferariam e se extinguiriam?
Quão eterna é a nossa engenharia? A nossa arquitectura? A nossa arte?
Que vestígios da nossa passagem se encontrariam?

Para tentar responder a estas questões A. W. analisa, com ajuda de cientistas, várias zonas do globo, desde floresta primitiva existente entre a Polónia e a Bielorrússia (Bielowieza Puszca) até à zona desmilitarizada entre as duas Coreias, que por diferentes motivos mantiveram ou recuperaram as suas condições selvagens.

Ficamos então a saber que a vingança da natureza começará pela ÁGUA, provocando o apodrecimento e a corrosão dos diversos materiais que sustentam as nossas vivências, retomando o seu lugar nas superfícies urbanas, como por exemplo Nova Iorque, que “tem sepultado os seus rios”, (e sem a intervenção diária dos funcionários do Departamento de trânsito e de Emergência Hidráulicas ficaria, numa semana, com as suas ruas principais submersas).

Com a queda de prédios (enriquecendo com o PH do solo com calcário vindo cimento), a falta de manutenção humana, a proliferação de sementes, o choque resultante das diferenças de temperaturas que provocariam fendas nos pavimentos, edifícios e outras estruturas urbanas, entre 10 a 100 anos a Selva do Asfalto daria origem a uma verdadeira selva.

Para além da água, o FOGO, resultante de raios de trovoadas secas, da falta de manutenção de refinarias, oleodutos e gasodutos e muitas outras industrias tomaria conta quer da vegetação espontânea entretanto nascida, quer dos materiais inflamáveis que permaneceriam como restos da civilização.

Quanto à FAUNA, cães domésticos teriam que competir com lobos e animais selvagens, os gatos adaptar-se-iam bem, assim como um grande número de espécies de aves agradeceriam a nossa ausência pois com ela, reapareceriam as florestas entretanto extinguidas, desapareciam os perigos mantidos e multiplicados com a nossa civilização, tais como prédios e a suas janelas, os poste de alta tensão e de telecomunicações.
A sentirem a nossa falta parece que só teríamos piolhos, determinadas bactérias e baratas existentes em cidades de clima frio.
Vacas e porcos tomariam conta do Havai e determinados ratos poderiam evoluir até ao tamanho de cangurus.
As restantes espécies iriam certamente respirar de alívio, mesmo as que tentamos ajudar, uma vez que o verdadeiro perigo é por nós criado.

Deixaríamos contudo HERANÇA: Ela passaria por registos geológicos, tais como amputação de montanhas (as Apalaches, no Estado de Virgínia) provocada pelas indústrias carboníferas nos anos 70, buracos nos territórios do Noroeste do Canadá, originados pela drenagem dos grandes lagos, ou de uma forma mais construtiva, as montanhas Maias.

Para não falar dos registos nucleares. Actualmente existem cerca de 30.000 ogivas nucleares intactas, cuja hipótese de explosão é impedida pela nossa guarda. Sem o nosso cuidado, o seu invólucro acabaria por se corroer, expondo e libertando os seus elementos e seria necessário 250 mil anos para que os níveis se perdessem na radiação natural da Terra.
Assim como as cinzas resultantes das munições de urânio empobrecido continuaram a emitir radiações nesse mesmo prazo.
Quanto ao plástico ou seja os variados polímeros artificiais, espalhados pelas águas e reduzidos a pó pela acção mecânica das marés, até pelo zooplâncton será engolido.

A quantidade actual de plástico levará centenas de anos a ser consumida mas acabará por se biodegradar.
Relativamente aos metais pesados como crómio, chumbo, mercúrio, serão necessários milhares de anos para serem reciclados pela futura flora.

E quanto às nossas OBRAS de ARTE, de ARQUITECTURA e ENGENHARIA?
Os edifícios de pedra mais antigos sobreviverão aos mais modernos.
As Cidades subterrâneas da Capadócia resistirão, mesmo que calotes de gelo avancem sobre a Turquia.
O canal da mancha ficará intacto apesar de inutilizado pela submersão das suas entradas.
A Pirâmide de Kéops ficará de pé, se bem que daqui a uns milhões de anos já se parecer muito com uma pirâmide.
O canal do Panamá, sem a manutenção técnica será destruído, originando com o tempo a união das Américas.
Nos museus, sem electricidade, sem controlo da humidade, com a água a entrar pelos talhados e pelas caves (partindo do pressuposto que as paredes ainda aguentariam umas centenas de anos), as pinturas dissolver-se-iam, mas as cerâmicas, caso nada caia sobre elas, ficariam a testemunhar os novos tempos, assim como todos os objectos de bronze.
A música é a que tem mais hipóteses de perdurar através de um dispositivo de leitura, contendo uma amostra alegadamente representativa de sons, ritmos e músicas, criado para acompanhar quer as sondas espaciais Pioneer 10 e 11, quer as duas Voyager.
Para registar parte da nossa cultura ficarão as ondas de rádio electromagnéticas, transportando os nossos sons e imagens, mesmos que distorcidos, para o Universo.

Estas e muitas outras curiosidades são dissecadas no livro indicado.

A conclusão é trágica, e não representa uma grande novidade:
Sim, a Terra, mesmo com nossa pesada herança, teria muitas hipóteses de sobreviver e se renovar, só precisamos de desaparecer.

Apesar de já existirem alguns movimentos (como VHMT- Movimento Voluntário para a Extinção Humana) a sugerirem tal medida, ela é por razões óbvias, de impossível concretização.

A Terra sem nós sobreviverá, mas nós sem ela não.

Temos que fazer melhor e mais rápido, senão for por Ela, pelo menos por Nós.

Rita Caceiro

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